Opções para quem não quer aguardar até o dia do juízo final

Beijo na boca não pode!

Para quem não sabe o que é, ou tem vergonha de dizer que sabe, inferninhos são boates como outra qualquer, com ambientes escuros, música alta, bebida e demais prazeres mundanos à disposição, inclusive, e principalmente, o mais desejado deles, o da carne. E para alcançá-lo, dispensa-se bom papo, visual atraente ou habilidades na pista de dança. Aqui, a conquista do prazer depende de um simples ato: abrir a carteira.

Inferninhos são onde prostitutas, clientes e eventuais curiosos vão a fim de encurtar as cerimônias entre o querer e o fazer “aquilo”. De uns anos para cá, é verdade, o termo banalizou-se, ficando assim um pouco mais comportado. Cadernos de programação cultural da cidade passaram a usar a palavra para designar qualquer festa realizada em locais fechados e pequenos. Clubes como Casa da Matriz, Fosfobox, Pista 3, Dama de Ferro e Lounge 69 são alguns desses infernos mais brandos.

Mas então onde é que a coisa esquenta de verdade no Rio de Janeiro, cidade que já não é lá muito santa? O bairro que mais se destaca pela tradição e pela quantidade de casas é Copacabana. Tanto que até Janis Joplin já freqüentou uma delas. A visita atípica, mas nem por isso menos extravagante, se deu no verão de 1970, quando a cantora hippie, reza a lenda, desceu fundo nos subterrâneos do bairro e fez um show obscuro para poucas pessoas. E se em Copa a carne já é fraca, na rua Prado Júnior e adjacências ela é mais ainda. Ali, a princesinha do mar, apelido derivado da música de Braguinha, usa mini-saia, top decotado e salto plataforma. Ao todo, são mais de seis casas.

O Barbarella e o La Cicciolina cobram o maior preço da praça: R$60 pela entrada, com direito a dois drinks. Nos outros, a média é entre R$15 e R$40, sempre com pelo menos uma bebida incluída. No entanto, apesar das diferenças de preço, todos eles contam com atrações similares, como strip-tease, DJ’s, samba e show de mágica. Nos inferninhos da Vila Mimosa, no outro extremo da cidade, o prazer custa mais barato: a entrada é gratuita e o “serviço completo” na faixa de R$10.

No Erotika, onde até o Mc Créu, aquele da música de mesmo nome, já tocou, para passar pela porta (do paraíso?) cobra-se R$30. Mulheres desacompanhadas não pagam. Numa terça-feira à noite, a oferta parece ser maior que a demanda, já que há mais mulheres que clientes em potencial. A maioria delas não parece ocupadas. Conversam entre amigas, bebem algo no bar, dançam, ou ajeitam o decote e a maquiagem no espelho. Rafael Prestes, jovem recifense, veio pela primeira vez ao Erotika e explica porque prefere inferninhos a prostíbulos convencionais: “Vou a lugares assim porque sou um cara romântico. Aqui você precisar abordar a mulher que te chama atenção, bater um papo, conquistar. Em puteiro você entra e já vai pro quarto com a rapariga”. O rapaz parece estar certo. A maioria dos freqüentadores só é abordada pelos garçons, que estão sempre enchendo os copos e oferecendo uma próxima dose. Ou então trazendo mais uma porção de amendoim torrado, cortesia da casa, que mal terminada já é prontamente reposta. O garçom diz que é “um mimo pros clientes”.

Com exceção de uma mesa com oito coreanos e de poucas outras com clientes que dão toda a pinta de serem já habitués do recinto, chamando pelo nome as mulheres que passam, a maioria não parece muito interessado no que o lugar tem a oferecer. Poucos olhares miram as duas dançarinas que rebolam nos dois queijos ao lado do palco principal. Uma delas é Maitê, que sai de seu posto só de fio-dental e faz um breve desfile pelo local. Em seguida, o nome dela é anunciado pelo DJ como protagonista de um “um show pra lá de picante que tomará o palco principal em cinco minutos”.

A trilha sonora então muda do Axé para aquelas baladas típicas de coletâneas musicais com “Love” no título. Maitê retorna acompanhada de Bruno. Os dois iniciam a performance dançando juntinhos e vão gradativamente despindo-se sob um banho de luz vermelha. Nas caixas de som, Bon Jovi entoa o refrão de “Bed of Roses” e o casal começa a transar de fato, encenando diversas posições, sempre tentando ressaltar a plasticidade do ato. Movimentam-se devagar, fazendo caras e bocas, como num filme pornô em câmera lenta.

Apesar do show, porém, animação não era mesmo a palavra de ordem no Erotika nessa terça-feira. Amanda, sentada sozinha na mesa ao lado, concorda: “Geralmente, mesmo que não arranje nenhum cliente, me divirto. Escuto música, encontro as amigas, bebo. Hoje, nem isso. Tá deprê aqui.”

Já na av. Atlântica, número 3432, a pasmaceira passa longe. Ali funciona a Help, inferninho tão grande e com tanta história, que talvez seja mais justo abandonarmos o sufixo “inho” e chamá-la logo de infernão. Preferida de dez entre dez gringos que vêm para a cidade com segundas intenções, a Help está presente até em vídeos no Youtube. Rumores recentes dizem que o lugar irá fechar as portas, dando lugar para a construção de um Museu da Imagem e do Som. Funcionários e prostitutas freqüentadoras duvidam da notícia. Érika, que mora em São Paulo, é uma delas: “Venho aqui há seis anos e sempre escuto isso. Mas não vai fechar não. Isso aqui sábado é cheio de global, tá na moda”, diz. De dentro, a Help nem parece a mesma da fachada decadente. As paredes são todas cobertas por reluzentes tecidos verdes, equipamentos de luz de ponta colorem a pista e o DJ Marcelinho da Rádio Transamérica é quem embala a noite. Nos dois telões, vídeos de esporte e clipes de hip-hop.

Ao contrário do que muitos podem pensar, inferninhos não são cenário para cenas chocantes, de “sacanagem”. Ela pode até ser planejada por lá, mas a ação propriamente dita só acontece entre outras quatro paredes. Até beijos na boca um pouco mais calorosos são coibidos pelos seguranças do local.

Outra opção ainda na cidade é a Praça Mauá. Lá, a boate Flórida oferece a promoção 5 por 1: quem levar consigo cinco amigos “ganha” uma mulher de graça. Rio de Janeiro é luxúria para pecador nenhum botar defeito; para todos os gostos e bolsos.